quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Fantasmagoria

"Por isso vão passar perante a turbamulta
Como abrupta avalanche, enorme catapulta,
Numa marche aux flambeaux, os famulentos vícios
Que cavaram no globo horrendos precipícios,
Os vícios imortais, que infestam tribos, greis,
Povos e gerações, seitas, templos e reis
E que são como a lava obscura da cratera
Que subterraneamente a tudo se invetera."
Cruz e Sousa, O Livro Derradeiro

Sorri quando caí; porque queria
Ter alma suspendida e sem cuidado
De coisa alguma que me houvesse ao lado;
Pois era tanta a morte que subia
Que nada me haveria machucado
Enquanto eu caía.

E enquanto à minha volta eu ouvia
Os vultos de fantasmas celerados
Cuspindo e vomitando seus pecados,
A lua lhes velava a vilania.
Mas olhos não os tinha tão velados
Enquanto eu caía.

E a vertigem que então descia
Por sobre a minha mente abandonada
Deixou a minha alma apavorada;
Não digo pela fantasmagoria,
Mas pela luz que andava degredada
Enquanto eu caía.

E o tropel horrendo que crescia
Diante desta face atordoada
Soava-me imensa gargalhada,
Tal qual Satã gozando em uma orgia...
E avançava a horda arreliada
Enquanto eu caía.

Fantasmas! Quem talvez se lembraria
Do vosso rosto humano delicado
Ao vê-lo assim, assaz desfigurado,
Atrás de diabólica histeria?
Que anjo mal vos houve aprisionado
Enquanto eu caía?

Leonardo Ramos.

Um comentário:

  1. Presente mais bonito da noite de Natal foi o tempo livre para visitar o "Albergue" e - contrariando avisos - demorar-me um pouco, em cada cômodo, em cada verso. "Razão" é de tirar o fôlego - como já eram outros poemas que conheci. Ah... Bonito demais, demais mesmo.

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O mural do Albergue não é quadro de mesa de sinuca. Pense antes de postar.